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O papel do juiz na colaboração premiada

Juiz folheando pilha de papéis sobre a mesa.

O artigo 4º, §6º  da Lei nº 12.850/2013 aduz que o Juiz não participará das negociações para a homologação dos acordos de colaboração, em decorrência de uma inspiração no sistema Norte Americano. Conforme ressalta Morais da ROSA (2018, p. 150).

o problema é que, como veremos, na cooperação premiada à brasileira, o Juiz pode confundir seus papéis e funções, em um mix de atividade inconciliáveis democraticamente, especialmente quando participa do jogo oculto de se alinhar ao acusador mediante o deferimento combinado de cautelares (prisão, condução coercitiva, sequestro, interceptações etc).

Nesse sentido, vislumbra-se que a função do Magistrado nas negociações é a de garantir o prosseguimento regular do processo, analisando se houveram nulidades e vícios aptos a invalidar a persecução penal, devendo sempre ser observado o princípio da imparcialidade sob pena de comprometer o andamento processual nos casos concretos.

Portanto, conforme a disposição legislativa, o Juiz poderá participar dos atos processuais nas negociações concluídos os atos relativos ao termo, com a indicação de oitiva do delator, sendo fundamental a presença de defesa técnica em todos os atos processuais, evitando coações e ilegalidades para posterior homologação dos acordos de colaboração premiada, nos quais deverão ser observados os requisitos formais na celebração do negócio jurídico (ROSA, 2018, p. 151.)

No tocante ao princípio do Juiz natural, e caso haja pluralidade de autores e de crimes, aduz VERÍSSIMO (2017. p. 118),

é necessário atentar, ainda, para outro princípio, o da unidade de jurisdição, a fim de evitarem-se decisões contraditórias, por exemplo, sobre os mesmos fatos criminosos.

Observa-se também que o envolvimento de pessoas com foro privilegiado alteram a competência para homologação dos acordos de colaboração devendo ser estritamente observados.

Ainda, analisando a importância do princípio do Juiz natural, observa Jacinto Nelson de Miranda COUTINHO (2018, p. 32),

a visão tradicional tem a larga desvantagem de desconectar a matéria referente à competência do princípio do Juiz natural, o que é inconcebível. Basta ver que em nome da relativização de tal princípio os nossos tribunais têm livremente alterado a competência em processos já constituídos, em flagrante violação à garantia constitucional do cidadão acusado.

Observa-se, então, o papel do Juiz como elemento fundamental na homologação dos acordos, no qual

o juiz precisa se consolidar como um ator garantidor das regras do devido processo e dos direitos fundamentais dos acusados, conforme orientação constitucional e convencional. (VASCONCELLOS, 2017, p. 94)

Referente a natureza dos crimes, competência e o colaborador, há alguns aspectos relevantes a serem observados pelo Magistrado.

Como a colaboração premiada é um meio de obtenção de prova, no qual os depoimentos apresentados pelos colaboradores, bem como provas e demais documentos constituem esses meios de prova, é fundamental que a homologação dos acordos ocorra pelo juízo competente para análise dos casos, pois ao mesmo caberá autorizar os meios de produção de provas, como as quebras de sigilo, interceptações telefônicas, buscas e apreensões, prisões temporárias, bem como caberá ao mesmo julgar os fatos delitivos cometidos pelos colaboradores na aplicação da pena VERÍSSIMO (2017, p. 119). Assim aduz VERÍSSIMO:

A identificação do juiz natural parte da Constituição, na qual estão estabelecidos os critérios ratione materiae e ratione personae, quanto ao mais, remete-se à legislação ordinária a definição da competência em razão do lugar, a natureza do crime (varas especializadas), seguindo-se o critério da prevenção e da distribuição’’. Outra questão de suma importância relativa as fases do processo é a competência para homologação dos acordos de colaboração premiada na fase pré processual ou processual em instâncias diversas.

Observa-se que se a negociação e homologação do acordo de colaboração for fechado na fase de investigação preliminar e o colaborador não possui prerrogativa de foro, a homologação deve ser realizada pelo juiz da primeira instância, podendo ser estadual ou federal, dependendo dos delitos cometidos especificados nos casos concretos.

Nos casos nos quais os colaboradores possuem foro privilegiado, o mesmo deverá ser homologado no juízo competente. No que tange aos colaboradores com prerrogativa de função, vislumbra-se a necessidade e previsão constitucional de defender o cargo ou a função pública que o indivíduo ocupa e não sua pessoa (VERÍSSIMO, 2017. p. 121).

Ainda, há a possibilidade e é algo recorrente na homologação dos acordos de colaboração o cometimento de crimes em distintas jurisdições territoriais.

Nesse sentido, poderá haver mais de um juiz competente para julgar o caso específico, sendo ideal que haja um acordo de colaboração negociado em conjunto por esses membros do Ministério Público nas diversas circunscrições judiciárias, possibilitando uma investigação mais efetiva na persecução penal (VERÍSSIMO, 2017, p. 122).

Há ainda os casos de modificação de competência, e questões relativas a conexão e continência processual. Nesse sentido aduz VERÍSSIMO (2017, p. 123):

a conexão e a continência têm por fundamento a necessidade de reunir delitos conexos ou diferentes agentes num mesmo processo, para julgamento simultâneo. Enquanto na conexão o interesse é probatório, na continência o que se pretende é manter a coerência diante de um mesmo fato praticado por duas ou mais pessoas. A colaboração premiada tem um efeito multiplicador de investigações preliminares, o que pode gerar novas colaborações, que levarão a mais investigações. Nesse quadro, a ideia de reunir delitos conexos num mesmo processo não é viável. A racionalidade da regra da conexão significa, então que as investigações e ações penais de delitos conexos sejam julgadas pelo mesmo juízo, em razão, principalmente, do conhecimento do material probatório e dos esquemas criminosos que se desvelam.

Nesse sentido, vislumbra-se a importância de analisar todos os requisitos de competência na homologação dos acordos de colaboração premiada, garantindo um julgamento efetivo na persecução penal, observado o princípio do juiz natural e a importância para a consolidação do que preceitua a Constituição da República, em seu art. 5º, LIII:

‘ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente’, garantindo-se um julgamento em consonância com o devido processo legal.


REFERÊNCIAS

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Observações sobre os sistemas processuais penais. Escritos do Professor Jacinto Nelson de Miranda Coutinho. Organizadores: SILVEIRA, Marco Aurélio Nunes da; PAULA, Leonardo Costa de. Observatório da Mentalidade Inquisitória. Curitiba, 2018.

VERÍSSIMO, Carla. Principais questões sobre a competência para homologação do acordo de colaboração premiada. Colaboração premiada. Coordenação MOURA, Maria Thereza de Assis; BOTTINI Pierpaolo Cruz. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2017.

VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. Colaboração premiada no Processo Penal. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2017.

ROSA, Alexandre Morais da. Para entender a delação premiada pela teoria dos jogos: táticas e estratégias do negócio jurídico. Empório Modara: Florianópolis. 2018.

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Autora: Paula Yurie Abiko

Fonte: https://canalcienciascriminais.com.br/

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