Há uma trilogia grega clássica que apresenta a metafísica como razão, sentimento e vontade. Tudo o que está acima da física (a metafísica) é composta de razão ou sentimento ou vontade, o que seria uma prova do invisível na composição do ser humano e mesmo do mundo.
Mitologias e tradições religiosas transportaram toda essa composição para as categorias de alma e espírito, e a própria ciência (ciências humanas e sociais aqui inclusas) aproveitaram, galgando categorias como consciência e psiqué. Esta última, aliás, é traduzida literalmente, do grego, para alma, porém na psicanálise o seu sentido é propositalmente ambíguo (consciência), assim como o geist filosófico: espírito e consciência, desde o historicismo alemão até pelo menos a sociologia weberiana.
Razão, sentimento e vontade. É essa a trilogia metafísica que nos separa dos animais irracionais. Somos, portanto, dotados de consciência e capacidade cognitiva, de emoções e sentimentos, e desse elemento volitivo que conduz às nossas ações, sejam elas refletidas (conscientes) ou emotivas/instintivas (passionais).
A vontade, pois, pressupõe consciência a priori, enquanto a ação passional dispensa, eventualmente, a conditio sine qua non da reflexão sobre o ato.
Por isso o dolo, enquanto definição ou limite de certa modalidade criminosa, requer expressa e recortada aferição de consciência de vontade: ato consciente, refletido e volitivo para o crime, que definitivamente repele, por exemplo, o improviso da paixão, do sentimento, da eventualidade.
Aliás, acerca da inexistência dessa criação denominada dolo eventual, já nos manifestamos aqui neste Canal.
Autor: André Peixoto de Souza.
Fonte: https://canalcienciascriminais.com.br/